Arte e literatura furry na educação

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Nos tempos atuais, a produção artística e literária adquiriu uma grande importância econômica e comercial. O crescente número de editoras e produtoras de conteúdo contribui para o fortalecimento deste mercado e para a popularização de livros e conteúdos artísticos visuais.

Devido a essa segmentação, surgiu uma nova classificação para a arte e para a literatura em sua forma mais tradicional: a arte e a literatura independente. O processo criativo tradicional, que acompanha a civilização humana desde sua origem, passa a fazer parte de um novo segmento. A arte e a literatura do povo, dos grupos culturais, dos grupos online e das fandoms passa a ser considerada ‘independente’, sem um intermediador para considerá-la um produto rentável.

Tal diferenciação proporciona uma importante diferença entre esses dois segmentos. Enquanto a arte e a literatura comercial seguem determinados padrões e estilos, suas formas independentes são completamente livres e espontâneas, sem regras de elaboração e planejamento, sem filtros de conteúdo e sem compromisso com a boa receptividade do público.

Pode-se concluir que as formas independentes de arte e literatura são as mais livres possíveis. Devido a isso, a velocidade de produção desse tipo de conteúdo é imensurável. Essa característica proporciona o surgimento de um grande volume de conteúdo disponível para livre uso em várias aplicações na área da educação, desde a elaboração de aulas e materiais didáticos até a produção de feiras escolares e apresentações artísticas. Muitas destas artes possuem licenças de uso coletiva ou colaborativa, o que proporciona a aplicação em meios educacionais sem infringir licenças e sem utilização indevida de conteúdo artístico protegido por direitos autorais.

Porém, é sempre necessário verificar questões envolvendo propriedades intelectuais como um todo. A maior parte da arte e da literatura independente disponível na internet não está disponível para livre uso, apenas sendo exposto por seu criador como medida de divulgação do conteúdo. Mesmo sendo para uso educacional, a apropriação indevida de conteúdo protegido por direitos autorais é considerada crime de acordo com o Código Penal Brasileiro. Recomenda-se sempre citar as fontes de localização do conteúdo e também os devidos créditos do artista.

A arte furry na educação[editar]

As fandoms constituem um grupo de produção de conteúdo artístico-literário na internet com bastante relevância. Estes grupos, além de reunirem fãs e apreciadores de temas específicos, como jogos de videogame ou sagas de filmes, reúnem também uma grande quantidade de artistas e escritores independentes dos quais produzem uma grande quantidade de material gráfico e textual.

O termo fandom é uma palavra-valise de dois vocábulos da língua inglesa: fan, fã e kingdom, reino. O significado ‘reino dos fãs’ faz sentido, pois é um grupo dotado de uma hierarquia, muitas das vezes, possuindo um “rei”, bem próximo ao conceito de líder ou mentor. Geralmente estes são os integrantes mais antigos ou mais experientes e exercem algum tipo de influência aos demais, sobretudo artística.

As fandoms são redutos muito importantes de produtores de conteúdos artísticos, textuais e midiáticos. São produzidos massivamente desenhos, pinturas, histórias em quadrinhos, livros e contos. Boa parte desse material está disponível para visualização na internet e uma parte está disponível para livre uso. Boa parte desse conteúdo também é comercializada ou encomendada, o que contribui para a formação de um mercado de produção artística independente.

Uma fandom extremamente importante é a que reúne os furries. A palavra furry, termo em inglês para ‘peludo’, tem total relação ao conceito básico da fandom: a criação de personagens antropomórficos autorais para representar os integrantes da comunidade (conhecidos como fursonas). O termo fursona é uma palavra-valise originada dos vocábulos em língua inglesa furry (peludo) e persona. Um fursona é um personagem que, muitas vezes, é utilizado como uma extensão de seu dono. Ao mesmo tempo em que este personagem representa seu dono na fandom, também pode representar desejos e anseios do possuidor. Muitas vezes, um fursona é usado para expressar algo que o dono não é na vida real. Dentro da fandom, os integrantes são reconhecidos primariamente por seus fursonas e não por suas identidades reais. O “sistema” de criação de personagens na furry fandom se assemelha muitas vezes ao do RPG de mesa, em que também existe certa autonomia na elaboração de personagens, apesar de existir algumas regras básicas no processo de criação.

Esta fandom extrapola os conceitos básicos das fandoms comuns, pois ela não tem uma base completamente estruturada e pronta para ser pautada, como ocorre em fandoms de filmes, de animações e de histórias em quadrinhos, em que um contexto primário totalmente delimitado já existe. Como não existe nada pronto, apenas o conceito básico, é possível criar múltiplas combinações de personagens e suas características, para, enfim, desenvolver histórias, enredos e interpretações de papéis. A total liberdade existente dentro da fandom para a criação possibilita o surgimento de uma quantidade inimaginável de conteúdo autoral independente.

Daieny Schuttz é integrante desse grupo de vasta produção de conteúdo. Bacharel em Desenho Industrial – Habilitação em Programação Visual e licenciada em artes visuais, ambas titulações pela Ufes – Universidade Federal do Espírito Santo, trabalha profissionalmente com arte gráfica e design gráfico freelancer. Publicou de forma independente 8 histórias em quadrinhos em volumes únicos, das quais estão disponíveis gratuitamente para leitura na internet, além dos volumes físicos disponíveis à venda em sua loja virtual.

Uma das contribuições de Daieny para a educação foi a doação realizada de algumas cópias de suas publicações para escolas e bibliotecas públicas da cidade de Vitória, no estado do Espírito Santo. Além disso, Daieny já fez visitas a escolas vestindo sua fursuit e interagindo com as crianças. Uma de suas ações aconteceu na Escola Estadual Anita Garibaldi, na cidade de Pocrane, no estado de Minas Gerais. A visita ocorreu de forma não-programada, visto que Daieny realizara a gravação de vídeo para seu canal no Youtube em uma praça no centro da mesma cidade em que a escola se localiza, quando fora vista pela diretora da escola, que lhe propôs realizar uma visita aos alunos. A visita consistiu em simples interações com as crianças no pátio ou nas salas durante o horário letivo e uma seção de desenhos.

A intervenção pedagógica de Daieny pode ser acompanhada em seu vídeo no YouTube denominado Visitando uma EE.

Esse tipo de interação auxilia na estimulação de processos criativos às crianças, além de proporcionar uma vasta gama de utilização em atividades posteriores. A vantagem desse tipo de visita às escolas é que toda a interação com o corpo discente é feita de forma espontânea, sem a necessidade de planejamento prévio das atividades. A partir disso, é possível estimular o processo criativo tanto dos alunos quanto do visitante.

A literatura furry na educação[editar]

Outra forma de produção de conteúdo dentro da furry fandom é a produção de textos literários. Um texto literário é aquele que tem uma função artística, prezando pela estética e pela subjetividade para construir narrativas ficcionais com base em acontecimentos do cotidiano, memórias, reflexões, abstrações e outras fontes diversas de inspiração.

Dentro desta classificação, encontra-se a obra denominada ‘Trilogia dos Vagabundos’, publicada pelo escritor independente paulista Acácio Pereira de Jesus. Trata-se de uma obra pautada nos processos imagéticos e fantasiosos encontrados na furry fandom e em outros grupos espalhados pela internet, como por exemplo, os de RPG de mesa. A história do livro se passa durante o fim da era medieval e inicio dos fantásticos tempos das máquinas à vapor. O enredo acompanha as vidas e desventuras de três viajantes: O Monge, a Espadachim e o Gatuno. Segundo o autor (P. J. ACÁCIO, 2018, WEBNODE - A TRILOGIA DOS VAGABUNDOS), a trilogia é uma saga de desventuras com os personagens animalescos mais humanos que existem no mundo da literatura, cheia de ação, romance, drama, tragédia e comédia.

Acácio, além de escritor, participa ativamente de grupos de criação online, sobretudo a furry fandom. Dentro desse grupo, utiliza-se de sua fursona Ratoruja, um híbrido de coruja (90%) e rato (10%).

Acácio descreve que sua aptidão pela escrita veio durante o período como estudante e foi reforçado pela bibliotecária da escola, de acordo com relato a seguir (P. J. ACÁCIO, CLUBE DE AUTORES): “Uma das coisas que mais gosto de fazer é escrever, toda minha vida cresci imaginando mil aventuras de personagens fictícios em universos inexistentes; tentei transformá-los em desenhos, mas fracassei, tentei fazer dessas histórias um jogo, mas igualmente fracassei. Um dia contei à bibliotecária do meu colégio sobre essas ideias, então ela me propôs escrever, e eu comecei, e nunca mais parei”.

A obra de Acácio pode ser considerada um fruto da união de um hobbie e da motivação proporcionada por um profissional da área da educação. Essa experiência pode ser norteadora para muitas atividades que mistura os passatempos dos alunos com a escrita e a leitura, além de um bom processo avaliativo de desempenho de escrita, de leitura e de processos cognitivos dos alunos.

A obra de Acácio fora publicada em 2018 de forma independente com recursos próprios e com a colaboração da FUNDACI — Fundação de Arte e Cultura de Ilhabela. Os autores independentes enfrentam algumas burocracias para terem suas obras publicadas. Se a obra não for economicamente interessante para a editora, ou o autor tem que financiar a publicação da própria obra ou tem que repassar a maior parte dos valores gerados pela venda das cópias das publicações para a editora. Segue relato de Acácio sobre parecer do processo (P. J. ACÁCIO, CLUBE DE AUTORES): “Tentei enviar, sem sucesso, para muitas editoras, mas as que responderam, depois de pesquisar um pouco, descobri não serem de confiança, ou, trabalharem de uma forma indireta com o autor”.